sexta-feira, 23 de março de 2012

Avillez e o seu Belcanto

Já há um par de meses que queria ir ao Belcanto... Mas o preço impediu-me. Nada com a assinatura José Avillez é barato e, sendo verdade que não testei a sua cozinha no Tavares, não o é por algum motivo. Com a excepção da Empadaria do Chef, que não tem motivo nenhum para apresentar empadas a mais de 5 euros mesmo considerando o tamanho e a utilização de bons ingredientes.

Comecei por ir ao Cantinho do Avillez que não é estupidamente caro. É acessível para a classe média, para um almoço de vez em quando. Foi aí que provei vieiras na frigideira com cogumelos e batata-doce de Aljezur, o meu irmão comeu atum grelhado com legumes e emulsão de soja e gengibre e o meu namorado hambúrguer de Barrosã DOP com cebola caramelizada e foie gras. Tudo delicioso, cozinhado no ponto, temperado na perfeição e com ingredientes de grande qualidade. Desde então sonhamos com as batatas fritas extraordinariamente estaladiças.

Depois experimentei as empadas (parece que abriu um restaurante novo no Campo Pequeno) mas não vou perder tempo com descrições. Boas empadas que certamente dão um lucro abismal, porque não valem nem de perto nem de longe o que pedem por elas.

Tive de esperar pelas minhas férias para ir ao Belcanto, porque os menus mais em conta (entrada+prato+sobremesa=35€) só estão disponíveis aos almoços dos dias de semana. Ir jantar ou ir ao fim de semana significaria gastar 60 ou 70 euros, sem contar com as bebidas. E ir a um restaurante assim quando se tem pressa para voltar para o escritório não vale a pena.

Ter de bater à porta para entrar é ligeiramente intimidante, mas a recepção simpática e sem demasiadas formalidades anula este efeito. A decoração é sofisticada - o toque da "biblioteca" onde os livros ou imitações de livros delineiam a frase "para ser grande sê inteiro" (Ricardo Reis) é particularmente bonito.

Escolhi pão tipo "cinnamon roll" mas de azeitona e broa, que era húmida e suave. Manteiga normal, manteiga de noz em forma de noz e outra que me pareceu de trufa, mas para ser honesta não tenho a certeza - não como trufa vezes suficientes para distinguir o sabor.

Ofereceram-nos a interpretação do chef de bacalhau com grão. Um hóstia com um grão tostado, uma gelatina misteriosa, sal e açafrão. A apresentação suscita curiosidade, a prova é uma surpresa - a gelatina é uma explosão de mar. Para mim, um bocadinho salgado demais... Mas inovador.

Passamos às entradas - o meu irmão comeu cavala com pasta de topinambo (sim, eu também nunca tinha ouvido falar) e pão torrado. A diferença que faz comer peixe de qualidade bem arranjado...

Eu escolhi a sopa de castanhas com foie gras. Detesto patês e fígados em geral mas gosto muito de foie gras em pequeníssimas quantidades - por dentro nasci rica, mas esqueceram-se de transpor esta característica para o mundo físico. Suave, aveludada, deliciosa.

Pratos principais: cabrito tenro com pele tostadinha e grelos temperados com rosmaninho para o mano; bife à marrare para a mana estaladiço por fora, manteiga por dentro (sim, fui um bocadinho quadrada na escolha, eu sei - mas não me apetecia os outros pratos disponíveis no menu de 35€). Batatas fritas estaladiças: check! 


Sobremesas: bolo húmido de chocolate com frutas (manga, kiwi, ananás), sorvete de manga (stunning) e o que me soube a baba de camelo. Muito bom - mas para mim podia ter mais bolo. Para o mano: queijo tipo serra com o que podemos chamar de carpaccio de broa tostada. Incrível como conseguem cortar a broa tão fina sem que se desfaça.




Os pratos em si, todos diferentes, eram muito interessantes e conferiram personalidade a toda a refeição, da entrada ao café.

É certo que os menus mais baratos não têm pratos que surpreendam imenso, mas o efeito surpresa estará com certeza em menus tais como o Menu do Desassossego (75€), que pretendo experimentar daqui a uns tempos se a economia não me arruinar os sonhos gastronómicos.

Um restaurante com novas interpretações de pratos tradicionais, com ingredientes de grande qualidade - um mimo especial que valeu bem a pena.